Em 2004, em Buenos Aires, na Argentina, um incêndio causado por um artefato pirotécnico na boate Cromagnón, vitimou 194 pessoas e deixou mais ao menos mais de mil feridos. A presidente da Ong Familia Por La Vida e professora, Nilda Gómez, 65 anos, perdeu o filho nessa tragédia, e veio fazer parte da programação dos 10 anos da tragédia da boate Kiss, para conversar junto das mães de janeiro. O painel ocorreu na Praça Saldanha Marinho, a partir das 15h, e junto de Nilda estavam Fátima de Oliveira Carvalho, mãe do Rafael, Ligiane Righi da Silva, mãe da Andrielle, e Tâmara Biolo Soares, responsável por conduzir o processo do Caso Kiss, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Semelhanças
No dia 30 de dezembro de 2004, o incêndio na casa noturna Cromañón, na capital argentina, resultou em uma das maiores tragédias do país. Diversas irregularidades estavam presentes naquela noite. A boate tinha capacidade para mil pessoas, mas tinham mais de quatro mil. A banda Los Callejeros utilizou um artefato pirotécnico durante o show, causando o incêndio. Além disso, as portas de emergência estavam fechadas, o que impediu muitas pessoas de saírem com vida do local. Nilda perdeu o filho, Mariano, aos 20 anos.– Meu filho foi apenas divertir-se, escutar música. Assim como os jovens da Kiss. E divertir é um direito de todos, principalmente dos jovens. Por isso, esses massacres, que eu não chamo de tragédia, ocorreram por vários fatores e as pessoas precisam pagar pelas suas responsabilidades.
Em 2014, 10 anos após a tragédia de Cromañón, 28 pessoas já tinham sido responsabilizadas. O sistema judiciário argentino entendeu o caso como imprudência e negligência dos agentes públicos, donos da boate e membros da banda. O prefeito da época, Aníbal Ibarra, foi impichado, por 10 votos a quatro. Aníbal foi acusado de permitir que a boate funcionasse com todas as irregularidades apresentadas durante o processo.
“Cada um resiste da forma que pode”
Durante o painel, Nilda expressa a dor da perda nas palavras, emocionou-se algumas vezes quando falava do sentimento de um pai que perde o filho. Foram transmitidas em um telão imagens da luta das famílias da tragédia de Cromagnon por justiça, tocou uma música em homenagem as vítimas, além de fotos dos 194 jovens que tiveram a vida interrompida.
A estrutura onde funcionava a boate, no bairro Once, famoso em Buenos Aires, continua no mesmo local, com um mural cheio de grafites, colagens e desenhos, pedindo justiça e memória pelas vítimas. Ao atravessar a rua, foi criado um santuário com fotografia das vítimas, nomes e idades.– Deixamos os tênis, que são símbolo do massacre, na fachada da boate. Mas, depois de tudo que aconteceu é tarde. O que lutamos mesmo é pela prevenção, pelo rigor da lei – ressalta Nílda.
A presidente da Ong, afirma que as leis de prevenção mudaram bastante desde 2004. A Familia Por La Vida conseguiu firmar uma parceria com o Estado, para denunciarem irregularidades que encontrassem em casas noturnas, bares ou até mesmo em eventos de grandes proporções. Além disso, as medidas incluíram mais sinalização interna das discotecas indicando a saída de emergência; menos tolerância ao limite de público autorizado para cada local e a colocação de cartazes indicando a quantidade permitida de pessoas no recinto. Locais com mais de um andar devem também fornecer, regularmente, informações sobre a resistência do prédio, segundo documento da Agência Governamental de Controle (AGC).
– Todos nós sofremos. Os sobreviventes sofreram também por pensarem que não iam mais conseguir nos ver. Temos hoje, apenas a ausência. é preciso chorar, porque cada um resiste da forma que pode.
O ex-presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da boate Kiss (AVTSM), Flávio Silva, pai de Andrielle Righi da Silva, vítima da Kiss, comentou que em 2013, alguns integrantes da Ong Familia Por La Vida, vieram a Santa Maria prestar solidariedade e ajuda aos familiares e sobreviventes do dia 27 de janeiro. – São várias semelhanças que nos ligam. Nos sentimos amparados pela Nilda e os outros integrantes. E mais uma vez, iniciando mais um ano de sofrimento, ela veio nos ajudar. Quando fui para Buenos Aires, uma das imagens na frente do local da tragédia que me chamou a atenção foram várias chaves expostas, porque se as portas de emergência não tivessem trancadas, mais pessoas teriam conseguido sair com vida. E lá, a justiça andou, várias pessoas foram punidas. Países vizinhos nos dando lição de cidadania e de direito penal.